sábado, 25 de agosto de 2012

Série Dr. Martin Fischer - 03: Aspectos históricos e biográficos da vida de Martin Fischer, idealizador e fundador do Museu Antropológico Diretor Pestana - MADP de Ijuí - um "HEIMATMUSEUM"!


Museu Antropológico Diretor Pestana - MADP de Ijuí
“Além de ser um Instituto Científico, o Museu Antropológico Diretor Pestana, tem ainda outra função. É uma espécie de ´Templo de Recordações`, pois o Museu, colhendo peças de recordações das antigas famílias, ´relíquias`, das quais se desfizeram, tinham a confiança que seriam guardadas  com o máximo de carinho e cuidado para as gerações futuras...”.  Martin Fischer (MADP 1 PI F1840)

Neste ano de 2012, o Museu Antropológico Diretor Pestana – MADP  completou 51 anos de existência, e assim quero aqui através deste artigo prestar uma singela homenagem ao idealizar organizador e primeiro diretor do MDP: Dr. Martin Fischer, agraciado com o título de  “Cidadão Ijuiense”  e “Professor Benemérito pela Fidene/UNIJUÍ”.
O seu sonho era organizar um “Heimatmuseum” (casa Museu) de cunho antropológico, semelhante ao “Museu do Homem” de Paris. Doando inicialmente o seu acervo pessoal de mais de 70.000 recortes de jornais distribuídos em pastas, e todas as suas pesquisas e objetos indígenas colhidos junto ao Alto Uruguai, que ele vinha reunindo ao longo dos anos, viu aos poucos, o seu sonho, se tornar uma realidade.

Dr. Martin Fischer com idade aproximada de 40 anos. Ele foi o idealizado e organizador do Museu Antropológico Diretor Pestana, criado 25 de maio de 1961, por Portaria assinada pelo então Frei Mathias, (Mário Osório Marques), diretor da FAFI. Foto: Acervo/MADP


 A trajetória de Martin Fischer
  
Martin Robert Richard Fischer, nasceu em Konigsberg, capital da Prússia Oriental, no dia 10 de fevereiro de 1887. Era filho de Phil Richard Fischer e  de Elise Rauschning Fischer.  A história de sua vida no Brasil pode-se resgatar e conhecer, pesquisando a “Coleção Martin Fischer”,  que se encontra disponível no Museu Antropológico Diretor Pestana de Ijuí. Doutor em direito, Fischer tinha domínio de seis línguas: alemão, espanhol, francês, inglês, latim e grego.
       Como capitão, lutou no “front” russo em 1914-1918, ferindo-se quase que mortalmente, sob as ordens diretas do kaiser Guilherme II. Foi condecorado com a Cruz de Ferro (Eisernes Kreuz) por serviços prestados ao governo da Alemanha, medalha esta, que encontramos na reserva técnica do Museu Antropológico Diretor Pestana. E é, com certeza, a mais conhecida condecoração militar do mundo.
 A fim de reconhecer a bravura de um soldado em campo de batalha e servir de estímulo aos demais na Guerra pela Libertação, uma nova medalha foi instituída pelo rei Friedrich Wilhelm III (1770-1840) da Prússia; esta medalha era inspirada em sua esposa, a rainha Luíse. (Mulher considerada uma forte inimiga por Napoleão e a qual falecera durante uma das investidas do exército francês em 1810). (MADP 1 PI F1840).  A data de instituição desta nova condecoração foi em 10 de março de 1813, a mesma data de aniversário de Luíse. (Para saber mais sobre a medalha “Cruz de Ferro veja (http://pt.wikipedia.org/wiki/Cruz_de_Ferro).
  Martin Fischer chegou pela primeira vez ao Brasil em 28 de fevereiro de 1921, a bordo do luxuoso transatlântico Brabantia. Logo se tornando o redator-chefe do jornal alemão “Deustsche Post,” de São Leopoldo, pertencente à firma de Wilhelm Rotermund, criador do Sínodo                Rio Grandense, que congregou a maioria dos luteranos gaúchos e tinha estreita relação com a Igreja Evangélica Alemã.

Transatlântico Brabantia
 Com as divergências entre os luteranos e católicos travadas através de artigos dos jornais, mais as questões políticas da época, o “Deustsche Post” sofreu vários atentados. Mas o de 28 de janeiro de 1928, foi o mais grave, aonde se deu o empastelamento do jornal.  (conforme o dicionário significa  amontoar confusamente (caracteres tipográficos) inutilizando a composição. Lembrando que os jornais daquela época eram montados com caracteres feitos de chumbo, letra por letra, linha por linha, e depois colocado em colunas. Muito trabalho... Quando por acidente se montava as frases erradas, ou deixava cair no chão se dizia que “empastelou tudo”. A palavra pode ter ainda o significado de depredar, destruir as instalações de um jornal, revista etc., por motivos políticos, ou pessoais).
  Após este triste episódio, Dr. Martin Fischer volta para a Alemanha e segue  trabalhando  como gerente na Agência Oficiossa do Governo em Berlim (WTB) e DNB ao qual dominavam  as comunicações na Alemanha.
Retorna ao Brasil em 1933, e traz consigo uma carta de recomendações as autoridades brasileiras, escrita pelo então Ministro do Brasil (embaixador) em Berlim, Coronel Gaelzer Netto.


Segundo as informações encontradas em seu Curriculum Vitae, Martim Fischer foi convidado pelo governo brasileiro para participar da Comissão Oficial para estudos  sobre a possibilidade de se realizar a imigração alemã  em grande  escala para o Brasil. Recebeu também, a missão do Ministério de Relações Exteriores  da Alemanha para monitorar e relatar as condições dos russos alemães transferidos em 1931/32  da URSS e China para as colônias do Alto Uruguai pela Cruz Vermelha e o “Rafaels Vereim” ( movimento financiado pela Igreja Católica que oferecia segurança e monitoramento aos refugiados binacionais), com  a combinação dos governos brasileiro e alemão. Ao término dessa missão, vai  para a Argentina aonde permanece trabalhando até o ano de 1937.
E foi na Argentina no ano de 1933, na cidade de Passarinhos, que  desembarcou junto com o Dr. Martin Fischer, Charlotte Wollermann, ou Carlota, como era conhecida. Nascida em 27/11/1902 na cidade de Bartenstein/Ostpr, filha de Ernst Wollermann e Emma Zenthofer Wollermann. Charlotte foi o grande amor  e companheira inseparável de Martin Fischer. Conseguimos entender a cumplicidade desse amor nas palavras do Dr. Orlando Dias Athayde:
”Dona Carlota acamada, no hospital de Augusto Pestana, RS. Então o velho Martin Fischer vinha ao hospital todos os dias, como um velho galã, um velho “dom Juan” todo alinhado, trazendo na mão um buquê de flores ou um bibelô. Neles dois existia uma compreensão, um afeto imenso, magnífico, que só quem ama traz no peito...”. (MADP 1 PI F1840)
Charlotte Wollermann, ou Carlota, como era conhecida, o grande amor de Martin Fischer

Com a ascensão de Adolf Hitler ao poder na Alemanha, houve a pressão para que Dr. Martin Fischer, então na Argentina, fizesse o juramento ao nazismo. Ato impraticável por este homem, que acreditava em valores e ideais de liberdade e conhecimento que já tinham sublimado em sua alma. Como poderia ele trair suas crenças?
Restava então, redigir a sua carta de demissão e vir embora para o Brasil. Podemos encontrar a cópia desta carta, como também a resposta dela feita pelo partido nazista, nas páginas do livro do Tenente Coronel Aurélio da Silva Py, então chefe da polícia do Rio Grande do Sul com o título de “A quinta coluna - A conspiração Nazista no Rio Grande do Sul”. Nesta publicação Py torna público todas as declarações feitas pelo Dr. Martin Fischer sobre o nazismo e a atuação da Gestapo na Argentina, selando assim a sua impossibilidade de retorno para a Alemanha.

Diante de todo este contexto, Martin Fischer largou tudo e foi morar as margens do Rio Uruguai, na cidade de Iraí, no noroeste do Estado. Tentar a vida como agricultor, em uma pequena propriedade, plantando cana de açúcar. Como resultado de seu trabalho Dr. Martin Fischer fabricou e patenteou a aguardente denominada de “Tatu”.
 Mesmo morando em Iraí a vida lhe trouxe muitas surpresas, algumas boas, como a inspiração para escrever o livro “Iraí, cidade saúde”. E outras que deixariam marcas profundas para o resto de sua existência, como o golpe financeiro e moral dado pelo seu sócio (Sr. Antonio Pauly) na fábrica de aguardente.  Sua prisão pelo delegado de Iraí feita baseada em acusações feitas pelo Sr. Pauly de que ele pertencia a “quinta coluna”,  e era um “espião nazista”. Entretanto, tal denúncia não foi longe. Ele imediatamente teve sua prisão anulada e sua liberdade concedida depois que o Delegado de Iraí recebeu um simples telefonema de Plínio Brasil Milano, então chefe da Delegacia de Ordem Política e Social do Rio Grande do Sul (DOPS/RS), treinado pelo FBI e que desmantelou a rede de espionagem no Rio Grande do Sul no inicio dos anos quarenta.
Também em Iraí houve a triste perda do único filho do Dr. Martin Fischer e Charlotte, com o seu nascimento natimorto.
Chega então, em meados de 1951, o momento de se buscar um novo lar nas terras da cidade de Ijuí, trabalhando no jornal Correio Serrano e Die Serra Post, fazendo suas traduções e o programa de rádio “A hora alemã”, na Rádio Repórter.
Chegou a hora de conhecer Mário Osório Marques, o ainda Frei Matias, que o convidou para organizar um Museu ligado a FAFI. E com quase 90 anos, Dr. Martin Fischer, participou do livro “Agosto de 1914” de Alexander Solchenitzin para o qual escreveu um  documento com 80 páginas.
Chega o tempo de sonhar, sonhar com a organização do “Heimatmuseum”, lugar no qual também deixaria seu legado e suas “relíquias”.
Algumas “relíquias”, bem definidas, como a pequena máquina de escrever portátil, companheira inseparável de Charlotte na sua chegada a Ijuí, o velho terno usado em ocasiões especiais pelo Dr. Martin Fischer, as fotografias da infância e família de Charlotte na Europa.
E as suas “relíquias” sutis levando a muitas alternativas de interpretações, quando pesquisamos em seus recortes de jornais, seus artigos escritos na velha máquina de escrever e nas correspondências trocadas com seu primo irmão Hermann Rauschning, que foi presidente do Senado alemão, em 1933, que denunciou o nazismo e se refugiou em  Londres...
Cartas do amigo e humanista Ernest Feder, responsável pela parte das comunicações da Alemanha, antes de Hitler e que também teve que abandonar sua Pátria e se refugiar no Rio de Janeiro, se tornando um dos grandes escritores no movimento de resistência ao nazismo, principalmente após a morte de seu amigo-irmão Stefan Zweig.
Ernani Fornari, Érico Verissimo, Ernesto Vinhares, Monteiro Lobato, Jorge Amado, Gert Koch Weser, Gaelzer Netto, Anastácio Nordenlolz, Theobaldo Neumann, Fritz Wertheimer, Coronel Ruy de Castro, eram alguns nomes que faziam parte de suas relações de amizade.
Pesquisando com atenção podemos até mesmo nos deparar com o telegrama de felicitações de aniversário para o Dr. Martin Fischer enviado por Juscelino Kubitschek, ex-presidente do Brasil e idealizador do Distrito Federal/Brasília, tal seu reconhecimento.


Dr. Martin Fischer, nos surpreende pelo seu conhecimento, mas nos arrebata pela grandeza do seu ser. E com um grande coração, já com quase 90 anos, ainda escrevia com convicção:”... Ninguém pode ver a alma do outro, por isso não é justo atirar pedras. Errar é humano, e afinal tudo é destino, na minha crença. Podemos então falar em culpa? Eu posso sinceramente lamentar...” (MADP 0.6.4 pasta 26 doc. 31).
Chega, enfim, o tempo do inicio e organização do Museu Antropológico Diretor Pestana MADP de Ijuí, que foi criado em 25 de maio de 1961,  em Portaria assinada por Frei Mathias. Completados 51 anos de existência no dia 25 de maio de 2012.
A partir da criação oficial do MADP, Dr. Martin Fischer vai empregar suas energias visando erguer e construir o Museu Antropológico Diretor Pestana de Ijuí, atualmente uma instituição de renome nacional e internacional.

Referências e fontes:
- Fonte das imagens e fotos: Acervo Imagens Museu Antropológico Diretor Pestana - MADP;
- MADP- 0.6.4 – Coleção Martin Fischer;
- “O Aviador e o Carroceiro”- Rene Gertz;
- Casa Stefan Zweig – on line
- "Colecção Ernst Feder 1851-1972". Disponível em: http://www.lbi.org;
- Jornais Correio Serrano anos 1940-1960;
- Livro: “A quinta coluna- A Conspiração Nazi no Rio Grande do Sul-“ Cel Aurélio da Silva Py;
- Pasta Regina Weber do MADP 0.4.1;
- Pasta Regina Weber – MADP -0.3.23.24;
- Livro: “Plinio Brasil Milano Patrono da Policia Civil do RGS”. Informações disponível em: http://www.pc.rs.gov.br/conteudo.php?cod_menu=439&cod_conteudo=2298

  Pesquisadora e historiadora Marcia Adriana Krug

Um comentário:






  1. Ijuí na formação dos municípios no Rio Grande do Sul:


    Os municípios foram criados no Rio Grande do Sul, em 1807, através do Decreto Real assinado por D. João VI.

    Em 1809 foram criados os primeiros 4 municípios no Rio Grande do Sul, entre eles Rio Pardo, à condição de vila.

    Em 31 de março de 1846, a vila de Rio Pardo foi elevada à categoria de cidade e Cruz Alta passou a ser distrito de Rio Pardo.

    Com a emancipação de Cruz Alta, em 1834, Ijuí passou para a administração como distrito.

    A vila Ijuí iniciou em 1890, pelo engenheiro Siqueira Couto como "Colônia Ijuhy Grande", com a colonização.

    A área de Ijuí em 1890, como distrito de Cruz Alta era de 2.639,08 km2.

    A área abrangia: 1- Pontão do Ijuizinho (hoje Joia); 2- Cadeado (hoje Augusto Pestana); 3- Águas Claras (hoje Catuipe); 4- Sede do General Firmino (hoje Ajuricaba).

    Ijuí enquanto distrito sua área era 2.639,08 km2. com a emancipação perdeu “Pontão do Ijuhizinho” (Joia) diminuindo sua área.

    Na sequência, a emancipação de Augusto Pestana, de Catuipe, de Ajuricaba e de Bozano, restou uma área de 907,52 km2.

    Mais perdas para distritos emancipados, hoje, Ijuí conta com 689,124 km2 de área geográfica.

    Os atuais distritos de Ijuí são: 1º Floresta; 2º Mauá; 3º Itaí; 4º Alto da União; 5º Chorão; 6º Santana; 7º Santo Antônio; 8º Barreiro; 9º Linha 6 Norte.

    A colonização usou a estratégia histórica na demarcação do mapa para distribuição das terras no interior rural, usando as Linhas.

    Linha foi denominada ao construir as primeiras estradas vicinais em direção ao interior do município, observando os pontos cardiais, indicando locais e distância, onde eram encaminhados os primeiros imigrantes em direção as suas propriedades. Depois se tornou identificação geográfica das localidades.

    As linhas eram uma espécie de corredores (passagem estreita) que formavam linhas dos quarteirões ou quadras para divisão das propriedades rurais no interior do município.

    Elas eram formadas observando a direção dos pontos cardeais, estabelecendo Linha 1 mais próxima da cidade, Linha 2 paralela, afastando-se, Linha 3, dai em diante, todas do mesmo lado.

    Hoje em direção ao Norte Ijuí tem 9 Linhas. Linha 1 fica em direção ao Itaí, até Linha 9, que se aproxima da divisa com Ajuricaba. No mapa são lidos da esquerda para direita.

    Em direção ao Leste ou nascente Ijuí tem 8 Linhas, sendo Linha 1, próximo da cidade, afastando-se até Linha 8, próximo da divisa do Município de Bozano.

    No lado Oeste ou poente Ijuí tem 8 Linhas, começando na Linha 1, próximo do Barreiro até Linha 8, próximo da divisa com Cel. Barros.

    Assim iniciou os primeiros projetos da colonização usando modelos simples, no mundo rústico, mas práticos nos tempos das matas, pelos pioneiros nas terras de Ijuí, na construção de uma história.


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