Museu Antropológico Diretor Pestana - MADP de Ijuí |
“Além de ser um
Instituto Científico, o Museu Antropológico Diretor Pestana, tem ainda outra
função. É uma espécie de ´Templo de Recordações`, pois o Museu, colhendo peças
de recordações das antigas famílias, ´relíquias`, das quais se desfizeram,
tinham a confiança que seriam guardadas
com o máximo de carinho e cuidado para as gerações futuras...”. Martin Fischer (MADP 1 PI F1840)
Neste ano de 2012, o Museu Antropológico Diretor Pestana
– MADP completou 51 anos de existência,
e assim quero aqui através deste artigo prestar uma singela homenagem ao idealizar
organizador e primeiro diretor do MDP: Dr. Martin Fischer, agraciado com o
título de “Cidadão Ijuiense” e “Professor Benemérito pela Fidene/UNIJUÍ”.
O seu sonho era organizar um “Heimatmuseum” (casa Museu) de cunho antropológico, semelhante ao
“Museu do Homem” de Paris. Doando inicialmente o seu acervo pessoal de mais de
70.000 recortes de jornais distribuídos em pastas, e todas as suas pesquisas e
objetos indígenas colhidos junto ao Alto Uruguai, que ele vinha reunindo ao
longo dos anos, viu aos poucos, o seu sonho, se tornar uma realidade.
A trajetória de Martin
Fischer
Martin Robert Richard Fischer, nasceu em Konigsberg,
capital da Prússia Oriental, no dia 10 de fevereiro de 1887. Era filho de Phil
Richard Fischer e de Elise Rauschning
Fischer. A história de sua vida no
Brasil pode-se resgatar e conhecer, pesquisando a “Coleção Martin
Fischer”, que se encontra disponível no
Museu Antropológico Diretor Pestana de Ijuí. Doutor em direito, Fischer tinha domínio de seis línguas:
alemão, espanhol, francês, inglês, latim e grego.
Como capitão, lutou no “front” russo em 1914-1918,
ferindo-se quase que mortalmente, sob as ordens diretas do kaiser Guilherme II.
Foi condecorado com a Cruz de Ferro
(Eisernes Kreuz) por serviços prestados ao governo da Alemanha, medalha esta,
que encontramos na reserva técnica do Museu Antropológico Diretor Pestana. E é,
com certeza, a mais conhecida condecoração militar do mundo.
A fim de reconhecer a bravura de um soldado em campo de
batalha e servir de estímulo aos demais na Guerra pela Libertação, uma nova
medalha foi instituída pelo rei Friedrich Wilhelm III (1770-1840) da Prússia;
esta medalha era inspirada em sua esposa, a rainha Luíse. (Mulher considerada
uma forte inimiga por Napoleão e a qual falecera durante uma das investidas do
exército francês em 1810). (MADP 1 PI F1840). A data
de instituição desta nova condecoração foi em 10 de março de 1813, a mesma data
de aniversário de Luíse. (Para saber
mais sobre a medalha “Cruz de Ferro veja
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Cruz_de_Ferro).
Martin
Fischer chegou pela primeira vez ao Brasil em 28 de fevereiro de 1921, a bordo
do luxuoso transatlântico Brabantia. Logo se tornando o redator-chefe do jornal
alemão “Deustsche Post,” de São Leopoldo, pertencente à firma de Wilhelm
Rotermund, criador do Sínodo
Rio Grandense, que congregou a maioria dos luteranos gaúchos e tinha
estreita relação com a Igreja Evangélica Alemã.
Transatlântico Brabantia |
Com as divergências entre os luteranos e
católicos travadas através de artigos dos jornais, mais as questões políticas
da época, o “Deustsche Post” sofreu vários atentados. Mas o de 28 de janeiro de
1928, foi o mais grave, aonde se deu o empastelamento do jornal. (conforme o dicionário significa amontoar confusamente (caracteres tipográficos) inutilizando a
composição. Lembrando que os jornais daquela época eram montados com caracteres
feitos de chumbo, letra por letra, linha por linha, e depois colocado em
colunas. Muito trabalho... Quando por acidente se montava as frases erradas, ou
deixava cair no chão se dizia que “empastelou tudo”. A palavra pode ter ainda o
significado de depredar, destruir as instalações de um jornal, revista etc.,
por motivos políticos, ou pessoais).
Após
este triste episódio, Dr. Martin Fischer volta para a Alemanha e segue trabalhando
como gerente na Agência Oficiossa do Governo em Berlim (WTB) e DNB ao
qual dominavam as comunicações na
Alemanha.
Retorna ao Brasil em 1933, e traz consigo uma
carta de recomendações as autoridades brasileiras, escrita pelo então Ministro
do Brasil (embaixador) em Berlim, Coronel Gaelzer Netto.
Segundo
as informações encontradas em seu Curriculum Vitae, Martim Fischer foi
convidado pelo governo brasileiro para participar da Comissão Oficial para
estudos sobre a possibilidade de se
realizar a imigração alemã em
grande escala para o Brasil. Recebeu
também, a missão do Ministério de Relações Exteriores da Alemanha para monitorar e relatar as
condições dos russos alemães transferidos em 1931/32 da URSS e China para as colônias do Alto
Uruguai pela Cruz Vermelha e o “Rafaels Vereim” ( movimento financiado pela Igreja
Católica que oferecia segurança e monitoramento aos refugiados binacionais),
com a combinação dos governos brasileiro
e alemão. Ao término dessa missão, vai
para a Argentina aonde permanece trabalhando até o ano de 1937.
E foi na Argentina no ano de 1933, na cidade
de Passarinhos, que desembarcou junto
com o Dr. Martin Fischer, Charlotte Wollermann, ou Carlota, como era conhecida.
Nascida em 27/11/1902 na cidade de Bartenstein/Ostpr, filha de Ernst Wollermann
e Emma Zenthofer Wollermann. Charlotte foi o grande amor e companheira inseparável de Martin Fischer.
Conseguimos entender a cumplicidade desse amor nas palavras do Dr. Orlando Dias
Athayde:
”Dona Carlota acamada, no hospital de Augusto
Pestana, RS. Então o velho Martin Fischer vinha ao hospital todos os dias, como
um velho galã, um velho “dom Juan” todo alinhado, trazendo na mão um buquê de
flores ou um bibelô. Neles dois existia uma compreensão, um afeto imenso,
magnífico, que só quem ama traz no peito...”. (MADP 1 PI F1840)
Charlotte Wollermann, ou Carlota, como era conhecida, o grande amor de Martin Fischer |
Com a ascensão de Adolf Hitler ao poder na Alemanha,
houve a pressão para que Dr. Martin Fischer, então na Argentina, fizesse o
juramento ao nazismo. Ato impraticável por este homem, que acreditava em
valores e ideais de liberdade e conhecimento que já tinham sublimado em sua
alma. Como poderia ele trair suas crenças?
Restava então, redigir a sua carta de demissão e vir
embora para o Brasil. Podemos encontrar a cópia desta carta, como também a
resposta dela feita pelo partido nazista, nas páginas do livro do Tenente
Coronel Aurélio da Silva Py, então chefe da polícia do Rio Grande do Sul com o
título de “A quinta coluna - A conspiração Nazista no Rio Grande do Sul”. Nesta
publicação Py torna público todas as declarações feitas
pelo Dr. Martin Fischer sobre o nazismo e a atuação da Gestapo na Argentina,
selando assim a sua impossibilidade de retorno para a Alemanha.
Diante de todo este contexto, Martin Fischer largou tudo
e foi morar as margens do Rio Uruguai, na cidade de Iraí, no noroeste do Estado.
Tentar a vida como agricultor, em uma pequena propriedade, plantando cana de
açúcar. Como resultado de seu trabalho Dr. Martin Fischer fabricou e patenteou
a aguardente denominada de “Tatu”.
Mesmo morando em Iraí a vida lhe trouxe muitas surpresas,
algumas boas, como a inspiração para escrever o livro “Iraí, cidade saúde”. E
outras que deixariam marcas profundas para o resto de sua existência, como o
golpe financeiro e moral dado pelo seu sócio (Sr. Antonio Pauly) na fábrica de
aguardente. Sua prisão pelo delegado de
Iraí feita baseada em acusações feitas pelo Sr. Pauly de que ele pertencia a
“quinta coluna”, e era um “espião
nazista”. Entretanto, tal denúncia não foi longe. Ele imediatamente teve sua prisão
anulada e sua liberdade concedida depois que o Delegado de Iraí recebeu um simples
telefonema de Plínio Brasil Milano, então chefe da Delegacia de Ordem Política
e Social do Rio Grande do Sul (DOPS/RS), treinado pelo FBI e que desmantelou a
rede de espionagem no Rio Grande do Sul no inicio dos anos quarenta.
Também em Iraí houve a triste perda do único filho do Dr.
Martin Fischer e Charlotte, com o seu nascimento natimorto.
Chega então, em meados de 1951, o momento de se buscar um
novo lar nas terras da cidade de Ijuí, trabalhando no jornal Correio Serrano e
Die Serra Post, fazendo suas traduções e o programa de rádio “A hora alemã”, na
Rádio Repórter.
Chegou a hora de conhecer Mário Osório Marques, o ainda
Frei Matias, que o convidou para organizar um Museu ligado a FAFI. E com quase
90 anos, Dr. Martin Fischer, participou do livro “Agosto de 1914” de Alexander
Solchenitzin para o qual escreveu um
documento com 80 páginas.
Chega o tempo de sonhar, sonhar com a organização do “Heimatmuseum”, lugar no qual também
deixaria seu legado e suas “relíquias”.
Algumas “relíquias”,
bem definidas, como a pequena máquina de escrever portátil, companheira
inseparável de Charlotte na sua chegada a Ijuí, o velho terno usado em ocasiões
especiais pelo Dr. Martin Fischer, as fotografias da infância e família de
Charlotte na Europa.
E as suas “relíquias”
sutis levando a muitas alternativas de interpretações, quando pesquisamos em
seus recortes de jornais, seus artigos escritos na velha máquina de escrever e
nas correspondências trocadas com seu primo irmão Hermann Rauschning, que foi
presidente do Senado alemão, em 1933, que denunciou o nazismo e se refugiou
em Londres...
Cartas do amigo e humanista Ernest Feder, responsável
pela parte das comunicações da Alemanha, antes de Hitler e que também teve que
abandonar sua Pátria e se refugiar no Rio de Janeiro, se tornando um dos
grandes escritores no movimento de resistência ao nazismo, principalmente após
a morte de seu amigo-irmão Stefan Zweig.
Ernani Fornari, Érico Verissimo, Ernesto Vinhares,
Monteiro Lobato, Jorge Amado, Gert Koch Weser, Gaelzer Netto, Anastácio
Nordenlolz, Theobaldo Neumann, Fritz Wertheimer, Coronel Ruy de Castro, eram
alguns nomes que faziam parte de suas relações de amizade.
Pesquisando com atenção podemos até mesmo nos deparar com
o telegrama de felicitações de aniversário para o Dr. Martin Fischer enviado
por Juscelino Kubitschek, ex-presidente do Brasil e idealizador do Distrito
Federal/Brasília, tal seu reconhecimento.
Dr. Martin Fischer, nos surpreende pelo seu conhecimento,
mas nos arrebata pela grandeza do seu ser. E com um grande coração, já com
quase 90 anos, ainda escrevia com convicção:”... Ninguém pode ver a alma do
outro, por isso não é justo atirar pedras. Errar é humano, e afinal tudo é
destino, na minha crença. Podemos então falar em culpa? Eu posso sinceramente
lamentar...” (MADP 0.6.4 pasta 26 doc. 31).
Chega, enfim, o tempo do inicio e organização do Museu
Antropológico Diretor Pestana MADP de Ijuí, que foi criado em 25 de maio de
1961, em Portaria assinada por Frei
Mathias. Completados 51 anos de existência no dia 25 de maio de 2012.
A partir da criação oficial do MADP, Dr. Martin Fischer
vai empregar suas energias visando erguer e construir o Museu Antropológico
Diretor Pestana de Ijuí, atualmente uma instituição de renome nacional e
internacional.
Referências e fontes:
- Fonte das imagens e fotos: Acervo Imagens Museu
Antropológico Diretor Pestana - MADP;
- MADP- 0.6.4 – Coleção Martin Fischer;
- “O Aviador e o Carroceiro”- Rene Gertz;
- Casa Stefan
Zweig – on line
- "Colecção
Ernst Feder 1851-1972". Disponível em: http://www.lbi.org;
- Jornais Correio Serrano anos 1940-1960;
- Livro: “A quinta coluna- A Conspiração Nazi no Rio
Grande do Sul-“ Cel Aurélio da Silva Py;
- Pasta Regina Weber do MADP 0.4.1;
- Pasta Regina Weber – MADP -0.3.23.24;
- Livro: “Plinio Brasil Milano Patrono da Policia Civil
do RGS”. Informações disponível em: http://www.pc.rs.gov.br/conteudo.php?cod_menu=439&cod_conteudo=2298
Pesquisadora e historiadora Marcia
Adriana Krug
ResponderExcluirIjuí na formação dos municípios no Rio Grande do Sul:
Os municípios foram criados no Rio Grande do Sul, em 1807, através do Decreto Real assinado por D. João VI.
Em 1809 foram criados os primeiros 4 municípios no Rio Grande do Sul, entre eles Rio Pardo, à condição de vila.
Em 31 de março de 1846, a vila de Rio Pardo foi elevada à categoria de cidade e Cruz Alta passou a ser distrito de Rio Pardo.
Com a emancipação de Cruz Alta, em 1834, Ijuí passou para a administração como distrito.
A vila Ijuí iniciou em 1890, pelo engenheiro Siqueira Couto como "Colônia Ijuhy Grande", com a colonização.
A área de Ijuí em 1890, como distrito de Cruz Alta era de 2.639,08 km2.
A área abrangia: 1- Pontão do Ijuizinho (hoje Joia); 2- Cadeado (hoje Augusto Pestana); 3- Águas Claras (hoje Catuipe); 4- Sede do General Firmino (hoje Ajuricaba).
Ijuí enquanto distrito sua área era 2.639,08 km2. com a emancipação perdeu “Pontão do Ijuhizinho” (Joia) diminuindo sua área.
Na sequência, a emancipação de Augusto Pestana, de Catuipe, de Ajuricaba e de Bozano, restou uma área de 907,52 km2.
Mais perdas para distritos emancipados, hoje, Ijuí conta com 689,124 km2 de área geográfica.
Os atuais distritos de Ijuí são: 1º Floresta; 2º Mauá; 3º Itaí; 4º Alto da União; 5º Chorão; 6º Santana; 7º Santo Antônio; 8º Barreiro; 9º Linha 6 Norte.
A colonização usou a estratégia histórica na demarcação do mapa para distribuição das terras no interior rural, usando as Linhas.
Linha foi denominada ao construir as primeiras estradas vicinais em direção ao interior do município, observando os pontos cardiais, indicando locais e distância, onde eram encaminhados os primeiros imigrantes em direção as suas propriedades. Depois se tornou identificação geográfica das localidades.
As linhas eram uma espécie de corredores (passagem estreita) que formavam linhas dos quarteirões ou quadras para divisão das propriedades rurais no interior do município.
Elas eram formadas observando a direção dos pontos cardeais, estabelecendo Linha 1 mais próxima da cidade, Linha 2 paralela, afastando-se, Linha 3, dai em diante, todas do mesmo lado.
Hoje em direção ao Norte Ijuí tem 9 Linhas. Linha 1 fica em direção ao Itaí, até Linha 9, que se aproxima da divisa com Ajuricaba. No mapa são lidos da esquerda para direita.
Em direção ao Leste ou nascente Ijuí tem 8 Linhas, sendo Linha 1, próximo da cidade, afastando-se até Linha 8, próximo da divisa do Município de Bozano.
No lado Oeste ou poente Ijuí tem 8 Linhas, começando na Linha 1, próximo do Barreiro até Linha 8, próximo da divisa com Cel. Barros.
Assim iniciou os primeiros projetos da colonização usando modelos simples, no mundo rústico, mas práticos nos tempos das matas, pelos pioneiros nas terras de Ijuí, na construção de uma história.